
Exposição: “Memórias de Ferro – A Fábrica Ipanema”
A área onde está localizada a Floresta Nacional de Ipanema, em Iperó (SP), é hoje uma Unidade de Conservação Federal administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Seu objetivo é proteger, conservar e restaurar o Morro Araçoiaba e seus ambientes associados — os remanescentes de Mata Atlântica e Cerrado paulista — bem como seus atributos naturais, históricos e culturais.
No local estão os vestígios de um dos primeiros complexos industriais de produção de ferro a funcionar no Brasil: a Real Fábrica de Ferro de Ipanema. Suas antigas construções, hoje integradas à paisagem e imbricadas à vegetação, acumulam camadas de memória.
As relações entre a fábrica, o Morro Araçoiaba e a floresta remontam ao século XIX. Desde sua fundação, o complexo industrial foi continuamente abastecido com os minérios do morro e com o carvão vegetal das matas do entorno, utilizados na produção de ferro. Duas das três cruzes fundidas na primeira corrida do ferro, realizada em 1818, ainda permanecem no local, incorporadas à paisagem.
A Real Fábrica de Ipanema foi oficialmente fundada em 1810, pouco após a transferência da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, como parte de um projeto para desenvolver a indústria nacional. Ao longo do tempo, o empreendimento passou por transições, diferentes gestões e sucessivas transformações, refletindo os diversos interesses e projetos voltados à industrialização do país e à produção do ferro — metal visto naquele momento como estratégico e associado à modernidade.
O primeiro diretor foi o sueco Carl Gustav Hedberg, responsável pelas instalações iniciais do complexo industrial, com destaque para a construção da barragem no rio Ipanema, que fornecia energia para o funcionamento do maquinário da fábrica. Sob a direção de Varnhagen, foram construídos dois altos-fornos, considerados marcos da siderurgia nacional. Desses fornos saíram muitos artigos necessários ao Brasil do século XIX, como panelas, gradis, escadas, bem como maquinário para engenhos de açúcar — especialmente durante a gestão do engenheiro João Bloem. Outro alto-forno seria instalado já no final do século XIX, sob a gestão do engenheiro Joaquim Souza Mursa.
Parte da infraestrutura desse complexo industrial e de suas tecnologias encontra-se preservada em Ipanema, tornando-a um importante patrimônio da história e da indústria do Brasil.
O pintor francês Jean-Baptiste Debret retratou a fábrica em uma de suas aquarelas, de 1827. Do mesmo modo, o fotógrafo de origem polonesa Julio Durski realizou uma série de imagens que registraram a fábrica no final do século XIX. Esses são alguns exemplos da iconografia produzida sobre o local que, junto com outras documentações e os estudos que vem sendo realizados sobre Ipanema, revelam diferentes aspectos da sua trajetória e das interlocuções com a história do Brasil.
Durante mais de um século, a fábrica operou de forma intermitente, atravessando os períodos colonial, imperial e republicano, até encerrar definitivamente suas atividades em 1912. Produziu ferro-gusa, barras, ferramentas, utensílios, peças militares, componentes industriais, entre outros objetos e materiais.
Hoje, em Ipanema, ainda permanecem alguns dos artefatos produzidos ao longo da trajetória da fábrica. São objetos que refletem os distintos momentos e desafios enfrentados pelo empreendimento. No ferro, permanecem as marcas do tempo. Material forte e resistente, o ferro transforma-se ao interagir com o ar, a umidade e o solo. Forjado pelas ações do tempo e pela natureza, adquire diferentes colorações, cria fissuras, forma sedimentos — constrói camadas de memória.